quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Coração a planar




Agora já não vejo o sol
nem seu reflexo lunar

levo as asas nos bolsos
e o coração a planar

neste voo nocturno
não sei onde vou aterrar

sinto as nuvens nos meus pulsos
e o leme sempre a consentir

são sempre os mesmos ossos que eu insisto em partir
neste vôo nocturno só quero mesmo resistir

neste vôo nocturno sou mais leve do que o ar
neste vôo nocturno não sei onde vou acordar

em baixo há manchas no canal
mas eu não as quero ver

poeira ou plano está frio
e as helices a ferver

o nariz do avião
só obedece a quem quiser

agora não existe nada
o meu motor ou ralentim

vou revendo em encurdina
tudo o que eu vivi

neste voo nocturno
a madrugada veem ai

neste voo nocturno sou mais leve do que o ar
neste voo nocturno não sei onde vou acordar

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

TABACARIA

"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
à parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a pôr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
..."
Parte de poema tabacaria de Álvaro de Campos

Uma parte da qual gosto especialmente... talvez pela carroça de tudo,
pelos todos os sonhos do mundo ou pela estrado do nada.
Não sei, mas vou descobrir.
*